Os Suspeitos (2013)

Um labirinto de tensão e discussões éticas


Os-Suspeitos-2013-3Você consegue pensar em um suspense que prende a atenção, acaba com as unhas do espectador, tira o fôlego de qualquer ser humano, entrega uma resolução sólida e uma conclusão brilhante? A resposta pode passar por nomes sensacionais, como Clube da Luta, Seven, O Silêncio dos Inocentes e Garota Exemplar, mas também vai esbarrar no espetacular (e, por incrível que pareça, pouco conhecido) Os Suspeitos.

O longa começa no Dia de Ação de Graças em Boston, quando duas garotinhas desaparecem depois de uma comemoração entre vizinhos. A partir daí, passamos a seguir o drama das respectivas famílias, enquanto o tempo passa e as investigações da polícia parecem não chegar a lugar nenhum. Tudo isso dividido em três engrenagens que se mostram igualmente brilhantes, principalmente quando você assiste o filme pela segunda vez.

O primeiro deles é o maravilhoso roteiro de Aaron Guzikowski, que, em 2013, só tinha o filme Contrabando no currículo. Ele constrói tudo de forma minuciosa e lenta, posicionando cada nova peça do quebra-cabeça no lugar certo e dando espaço suficiente para cada uma dessas pistas mexa com a cabeça do espectador. Além disso, o próprio detetive avisa em certo momento da trama que tudo importa e o texto de Guzikowski segue essa regra de forma rigorosa, fazendo com que cada fala, animal ou objeto posicionado em cena tenha sua importância e explicação até os últimos segundos.

Outra aspecto muito importante do roteiro está na sua divisão em duas histórias paralelas: um suspense policial angustiante e um drama familiar pesado. De um lado, obviamente o texto aposta na investigação policial e em boa parte daquele quebra-cabeça que eu já citei, enquanto do outro Aaron consegue colocar as famílias em um impressionante estudo sobre limites éticos e morais. É um show de discussões filosóficas e religiosas que mostra como cada pessoa pode reagir a momentos altamente emocionais, justificando suas ações para o público de forma intensa e complexa.

Não existem respostas fáceis nessa história e a direção do Denis Villeneuve faz questão de mostrar isso em cada plano escolhido. O diretor – que é indiscutivelmente um dos melhores dessa geração – deixa claro que entende esse gênero como poucos aos usar todos os recursos disponíveis de forma impecável, incluindo os efeitos sonoros, a edição de Joel Cox, a trilha musical de Jóhann Jóhannsson e a fotografia gélida e azulada de Roger Deakins.

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Mesmo assim, um dos principais destaques do seu trabalho (e de toda a sua carreira) é a forma como ele cria angústia e tensão com movimentos de câmera, ângulos inesperados e planos fechados que interrompem as cenas abruptamente. Assim como James Wan faz em Invocação do Mal 2, Villeneuve usa essas técnicas para explorar o espaço de um jeito bem minimalista, mexendo com a percepção do espectador que não sabe exatamente onde está nos momentos de maior suspense.

E, por fim, a última (mas não menos importante) engrenagem desse labirinto de peças é o elenco que brilha junto com personagens recheados de crenças, problemas e necessidades tridimensionais. São todos críveis e reais, sendo que os grandes destaques certamente vão para as explosões de raiva de Hugh Jackman, os conflitos éticos de Terrence Howard, a obsessão de Jake Gyllenhaal e as incertezas que cercam Paul Dano. Eles ocupam a maior parte do tempo de tela, mas acabam dando algum espaço para Viola Davis, Maria Bello e Melissa Leo (completamente irreconhecível) darem um gostinho variado de como uma mãe pode lidar com o sofrimento de perder um filho.

O resultado disso tudo é um longa completo que prende a atenção e a respiração do público, cria bons espaço para discussão, surpreende muito quando as peças finalmente se encaixam e ainda arruma tempo para mexer com a cabeça do espectador com um maravilhoso final aparentemente aberto. Os Suspeitos é um filme pesado e de certa forma difícil de assistir, mas também é um daqueles longas que marcam um pessoa, merecendo ser visto e revisto várias vezes. Vale muito a pena!


OBS 1: Esse e todos os outros filmes do diretor Denis Villeneuve (Incêndios, O Homem Duplicado e Sicario) estão disponíveis na Netflix, então pode ir correndo fazer uma maratona. Todos são muito bons.

OBS 2: Usei o aparentemente ali em cima, porque eu não acho o final desse filme aberto. Tudo importa e, na minha opinião, a resolução está ali clara como a lua.


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