Para assistir em meio a súplicas de desgosto e inconformidade com sua história chocha e enfadonha.
O Cristianismo parece ser uma fonte sem fim para os produtores de filmes de terror encontrarem suas ideias. E Sam Raimi (“A Morte do Demônio”, 1981; “Arraste-me Para o Inferno”, 2009) volta a dar as caras no terror, depois de sair um tanto quanto abatido das produções de “Oz: Mágico e Poderoso” (2013). No entanto, acaba por apresentar mais do mesmo em “The Unholy” (2021), ou “Rogai por Nós“, nas terras brasileiras , não se destacando em, praticamente, nenhum aspecto de sua cinematografia.
Acompanhamos na trama o jornalista Gerry (Jeffrey Dean Morgan) que, enquanto lida com sua decadente reputação, investiga uma série de acontecimentos milagrosos numa cidadela de New England atribuídos a uma aparição de Nossa Senhora, após a cura de uma surda-muda local chamada Alice (Cricket Brown), a qual também afirma “conversar” com a Santa Mãe de Deus. No entanto, com o recitar da ladainha, o que, antes, parecia ser um toque da mão de Deus, acaba se tornando um sopro ardente de algo demoníaco.
“Rogai Por Nós” é tudo o que você pode esperar de um filme típico de terror: uma entidade demoníaca, padres e exorcismos, jumpscares e afins. Poderia aqui ser encerrada a crítica, pois nada de inventivo nos é apresentado e a trama tem pouca sustância.
Em certos momentos, a direção de Evan Spiliotopoulos parece querer imitar o estilo de James Wan em “Invocação do Mal” (2013), quando usa planos “entortados” para criar uma sensação de desconserto ao que é apresentado, ou a repetição de quadros que mostram espaços vazios, atenuando o suspense. Mas, por mais que algumas sequências de “Rogai por Nós” funcionem bem quando separadas, ao serem unidas numa só produção, ficam um tanto quanto destoadas e sem identidade.
O que Sam Raimi consegue fazer com os jumpscares em “Arraste-me Para o Inferno” (2009), não é tão bem realizado aqui em “Rogai Por Nós”. Muito pelo contrário, não só temos sustos ineficazes, como previsíveis, fazendo com que a qualidade do filme caia.
Ao menos, o filme não nega a origem diabólica das obras consideradas milagrosas. O espectador, desde o início, sabe (ou, pelo menos, desconfia) que o que está acontecendo não é algo lá muito santo. E “Rogai Por Nós” também sabe disso. Ou seja, não há uma insistência em criar um plot-twist acerca da fonte dos acontecimentos sobrenaturais. No entanto, tal tentativa é direcionada à linhagem da entidade, o que leva ao temido, mas praticamente inevitável, clichê.
E por falar nela, o que “Rogai Por Nós” apresenta como sua “Maria”?
Nada muito assustador. A bruxa Maria Elnor, apresentada no início do filme, parece mais ter saído de um filme do “O Senhor dos Anéis” (2001) do que do inferno a qual estava condenada. Além disso, movimenta-se quase como o Sméagol, num jogo de contorcionismo que passa longe de assustar.
E isso nem mesmo quando sua máscara da Virgem Maria é retirada, revelando seu rosto consumido pelas chamas. Parte dessa culpa, é da computação gráfica, que não dá tanto realismo à entidade, que deveria ter sido abordada com mais cuidado, uma vez que é o que movimentaria a história.
Porém, ao observarmos a ideia-base de “Rogai Por Nós”, vemos que, mesmo que mínima, sua proposta foi estudada e explicitada.
Ao utilizar do versículo bíblico de Mateus que referencia os falsos profetas que vêm em pele de cordeiro, mas, por dentro, são lobos arrebatadores, “Rogai Por Nós” consegue alcançar seu objetivo de mostrar isso. Mesmo com uma trama genérica, sem diferenciais e com poucos elementos assustadores, o filme faz seu nome ao retratar os perigos de um fundamentalismo cego, que não mede fins para justificar os meios, temática essa amplamente abordada pelos diretores de Hollywood e, recentemente, vista em longas como “Saint Maud” (2019).
Contudo, ao passo que tenta demasiadamente vender sua ideia, “Rogai Por Nós” acaba se perdendo e não oferecendo algo que realmente seja agradável de acompanhar. E se esvai, em sua própria proposta. A sequência final prova isso, quando Maria Elnor é derrotada e seu espírito desaparece. O que resta, para a produção, é ser redundante e expositiva quanto ao motivo da vitória do bem sobre o mal.
Quanto ao elenco, até se esforçam para convencerem, mas até um certo ponto. Se o personagem de Jeffrey Morgan pouco teme a entidade, por quais razões o espectador deveria temer? Katie Aselton, oferece um bom contraponto como a ligação emocional de Alice, interpretada pela jovem Cricket Brown, que é a que mais satisfaz em suas emoções verossímeis, bem como as cenas em que está regozijada com as mensagens de Maria, ou confusa e perturbada, nas sequências finais.
Os outros personagens, como o Bispo, o Inquisidor do Vaticano e o Pároco local, por não terem um arco mais bem trabalhado, acabam por ser mais do mesmo, e se tornam pouco relevantes, tratando-se do “brilho” da obra.
“Rogai Por Nós” é um filme típico do que chamaríamos de “terror de shopping”, com direito a um enredo sem sal, personagens sem arco e sem estudo e sustos previsíveis e ineficazes. Os poucos minutos que realmente entretém são devidos à boa execução de sua ideia base, que se une, mesmo que aos poucos, de uma forma concisa e clara, situação que, durante grande parte da produção, falta ser a linha de direção, o que concede ao produto final algo sem muita identidade e digno de pouco destaque.
Porém, fato é fato: nem a melhor das orações é capaz de redimir esse filme.