O Pequeno Corpo – Crítica | Uma jornada de fé

o pequeno corpo
Foto: Divulgação Pandora Filmes

“O Pequeno Corpo” é o longa de estreia da diretora Laura Samani, é um filme italiano de 2021 que finalmente ganhou sua estreia oficial em território brasileiro, nesta quinta-feira (16/11). Trata-se de um bonito relato sobre maternidade e fanatismo religioso, com uma abordagem menos óbvia do que estamos acostumados a ver no cinema tradicional de Hollywood.

Qual a trama de “O Pequeno Corpo”?

Agata (Celeste Cescutti) dá luz a um natimorto e é informada pelo padre local que, de acordo com os dogmas da igreja católica, seu filho não poderá ser batizado, já que não nasceu com vida, portanto, será condenado a passar a o resto da eternidade no limbo. Quando ela descobre sobre um santuário que revive bebês por alguns segundos para que possam receber o sacramento do batismo, embarca em uma jornada para encontrar o local e assegurar a salvação da alma de sua criança.

Confira também: Vai e Vem – Crítica | Luz, Câmera, Mulheres em Ação

Foto: Divulgação Pandora Filmes

O que achamos do filme?

O longa tem menos de uma hora e meia, não obstante a diretora toma todo tempo do mundo para desenvolver com calma sua narrativa, focando unicamente na travessia vivida pela mãe, sem se distrair com subtramas desnecessárias, uma aposta certeira, nesse caso, já que nos permite entrar na psique da protagonista, deixando o espectador cada vez mais investido em sua história.

Nesse sentido, o ritmo mais lento não é sinônimo de cansativo, pelo contrário, serve para aumentar a tensão, já que a urgência é passada no desespero da mãe e não por meio de uma montagem frenética. Ou seja, quanto mais devagar são retratados os eventos do filme, mais o espectador fica – propositalmente – angustiado, na expectativa de ver aquela mulher chegar logo ao seu destino final. É a edição a serviço da narrativa, contando, sem precisar dizer.

A caminhada de Agata é dificultada por uma série de percalços que enfrenta ao longo do caminho, dividindo a trama em mini capítulos que reforçam a sensação de perigo constantemente enfrentado pela personagem principal, lembrando-nos do quanto está em jogo para que ela voluntariamente se arrisque tanto, sem nunca cogitar desistir. É preciso admitir que algumas dessas passagens são um pouco enfadonhas, mas felizmente, esses momentos são curtos.

Em um filme que aposta em poucos diálogos, a atriz iniciante, Celeste Cescutti, é quem fica responsável para passar o peso dos sentimentos, e chega a ser difícil acreditar que se trate de alguém sem nenhuma experiência prévia. Sua poderosa performance se beneficia de uma mistura de força com sutileza, sem exageros, ela trabalha dentro de um tom contido de quem quer gritar, mas não pode e, ainda que pudesse, não seria ouvida.

Confira também: Incompatível com a Vida – Crítica | Luto precoce e violência institucional

Foto: Divulgação Pandora Filmes

A diretora equilibra o retrato de um drama intenso e emocionalmente violento com um ar fabulesco e abraça o absurdo de sua premissa, incorporando-o na estética do filme e durante toda sua trajetória. A começar pela personagem de Lynx, responsável por servir como uma espécie de guia da protagonista, que aparece como um passe de mágica da natureza, com seus traços que lembram os de um elfo/ninfa. Assim como alguns seres místicos (a exemplo dos próprios anjos católicos) Lynx não se enquadra em uma definição binária de gênero.

A magia aparece em vários outros momentos da trama, desde seu início até seu desfecho, e passa por rituais, cânticos, tradições e preces. O misticismo e a fé são as motivações de Agata, mas também o fio condutor da trama. Afinal, só faria sentido suportar tantas provações se ela acreditasse, e como ela acredita, nós também acreditamos.

Há uma denúncia (nada) velada desse fanatismo religioso que leva mulheres a buscarem por soluções absurdas em momentos de dor frente ao desamparo que sofrem da própria igreja que lhes dispensam um tratamento frio e maridos indiferentes ao seu sofrimento, muitas vezes colocando em risco suas próprias vidas, repetidamente. A crítica vem de forma silenciosa, sem palestrinha, em perfeito tom com o silêncio exigido das mulheres daquela época, que ainda ressoa nos dias atuais.

Foto: Divulgação Pandora Filmes

 

8/10
Total Score
Total
0
Shares
Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Previous Post
vai e vem

Vai e Vem – Crítica | Luz, Câmera, Mulheres em Ação

Next Post

Bihter: O amor proibido é a base desse novo filme turco no Amazon Prime

Related Posts