A Escola do Bem e do Mal – Crítica | Um conto de fadas para o mês do Halloween

Foto: Divulgação Netflix

Quem não quer o seu próprio “felizes para sempre”, não é verdade? Desde a infância, somos fisgados com alguns ideais e algumas lições que são especialidade dos Contos de Fadas. E nesse mês do Halloween, a dona Netflix trouxe mais um filme original para seu catálogo: “A Escola do Bem e do Mal”, dirigido por Paul Feig (“Caça-Fantasmas”, 2016) e baseado numa famosa série de livros de fantasia, escrita por Soman Chainani.

Com um elenco diverso e carismático, acompanhamos a aventura das jovens Sophie (Sophia Anne Caruso) e Agatha (Sofia Wylie), habitantes de uma vila pequena e de mente fechada. Ao descobrir a existência de uma escola que treina heróis e vilões para os futuros contos de fadas, Sophie se vê tentada a ser uma das alunas, na tentativa de fugir de um mundo o qual acredita não pertencer. E como num passe de mágica, as duas jovens amigas logo são transportadas além do mundo real e deixadas, cada uma, numa escola. Com um sentimento de insatisfação por tal escolha e um desequilíbrio entre as forças opostas da magia prestes a dominar a instituição, os limites entre o bem e o mal estarão por um fio.

A Escola do Bem e do Mal é o novo filme de fantasia da netflix estrelado por Charlize Theron
Foto: Divulgação Netflix.
A POção Mágica dos Contos de Fadas

Temos aqui uma história bonitinha, leve e família, sobre a força da amizade, perseverança e a possibilidade de seguir um caminho que não seja tão “preto ou branco”. Afinal, lidamos com um enredo pautado em um dos principais objetivos dos contos clássicos: trazer uma lição e evidenciar a soberania do bem sobre o mal.

Mas é claro que, para nossas personagens, nada será tão fácil assim. Se existe algo que os produtores gostam de fazer quando criam alguma coisa sobre contos de fadas, é tentar trazer algo inovador. Estamos, afinal, numa época em que a inovação é o que chama a atenção. Porém, na maioria das vezes, acabam por repetir a receita da mesma poção mágica de sempre: vários frasco das narrativas dos Grimm misturadas, algumas gotas de modernismo e uns sete ramos de exageros para deixar tudo com um aspecto bem infanto-juvenil.

É o que vemos, por exemplo, em “Ever After High” (2013-2018) e “Once Upon a Time” (2011-2018), séries também disponíveis no catálogo da Netlix. O que seria algo inovador bebe da mesma fonte mágica de inúmeros outros trabalhos que já vimos por aí em algum lugar.

Foto: Divulgação Netflix.

Assumindo, talvez, que sair da zona de conforto não era bem a intenção de Paul Feig ao adaptar os homônimos livros, entendemos que “A Escola do Bem e do Mal” pode ter, realmente, algo em que apostar. E que faz toda a diferença, nesse caso. Temos, aqui, personagens cativantes e, por mais clichês que pareçam ser, torna-se interessante tentar descobrir o destino que os aguarda.

Sophia Anne Caruso (Musical “Beetlejuice”, da Broadway) entrega uma protagonista que não deixa dúvidas de que será a vilã da história toda, indignada de ter sido colocada num lugar que não é o seu verdadeiro, e facilmente ingênua para cair nas tramoias do verdadeiro vilão. Sofia Wylie (High School Musical) é mais uma que esbanja carisma e revolução — porque não pode faltar, não é mesmo?! — como uma princesa deslocada, forte e persistente. E não podemos deixar de falar da desenvoltura de Charlize Theron (Atômica“, 2017) ao interpretar a imponente e estilosa reitora da Escola do Mal, Lady Lesso.

E por fim, mas não menos importantes, temos o protótipo de príncipe perfeito, na figura de Tedros (Jamie Flatters, “A Batalha Esquecida”, 2021); a reitora da Escola do Bem, Professora Dovey (Kerry Washington, “Scandal”, 2012-2018); a professora de beleza, Anêmona (Michelle Yeoh, “Tudo em Todo Lugar Ao Mesmo Tempo“, 2022); e, quase que imperceptível, Cate Blanchett (“O Beco do Pesadelo“, 2022), dando sua envolvente voz à pena narradora.

Foto: Divulgação Netflix.
Uma Fantasia não tão mágica

Se, por um lado, temos personagens com grande potencial de empatia, também os vemos serem mal aproveitados. A impressão que temos é que “A Escola do Bem e do Mal” possui muitos plots para pouco tempo de tela, o que deixa algumas informações mais esquecidas que o sapatinho de cristal da Cinderela na escadaria do castelo. O antagonismo das escolas, a personagem do diretor (interpretado por Laurence Fishburne, da trilogia “Matrix”), a presença do místico Rafal (Kit Young)… nada é suficientemente desenvolvido, mesmo que de uma forma mínima, para dar mais propriedade aos eventos principais da história.

O próprio desfecho acontece de forma rápida e questionável. Num instante, as paredes deixam de cair, e voltam à reconstrução, porque determinada personagem mudou de ideia. E isso, tendo em vista a “inigualável força do mal” que tinha sido posta em cheque minutos antes.

Além desses aspectos narrativos instáveis, alguns efeitos especiais causam tristeza. Isso porque “A Escola do Bem e do Mal” é assumidamente uma fantasia. É preciso montar um universo crível e real, como se quisesse nos provar a existência de tal mundo, porque motivos para ser inconcebível temos antes mesmo de começar a sessão. E, em muitas cenas, isso não acontece, dando espaço a um chroma key perceptível e mal acabado. Porém, o pouco que acontece não consegue ser tão influente na trama geral, já que contamos com uma fotografia colorida, e cenários e figurinos que realmente parecem terem saído de livros (o que, de certa forma, é verdade).

A direção de Feig não poupa esforços para tentar subverter qualquer tipo possível de ideia pré-concebida acerca de seu filme. Os modernismos implementados à trama são bem alocados, e vão desde aparições sutis, como em concepções acerca do protagonismo feminino e o preconceito que o envolve, até mais descaradas, como Billie Eilish tocando em cena, ou uma versão épica de “Toxic“, de Britney Spears servindo de trilha sonora para uma batalha cheia de explosões e feitiços.

Foto: Divulgação Netflix.
Moral da história

E como um bom filme de princesas, fadas, forças do mal e finais felizes, chegamos ao fim de “A Escola do Bem e do Mal” com algumas indagações, mas uma experiência leve e gostosa de ter acompanhado. Não precisamos entender que tudo nessa vida depende de um príncipe encantado ou de acontecimentos mágicos para nos trazer realização, como as próprias Sophie e Agatha entram em acordo (depois de quase terem destruído a escola). Mas, acima de tudo, temos que dar valor aos amigos e amores verdadeiros. Podemos estar cansados de tanto conteúdo igual nessas fantasias, de tantas lições de moral que já ficamos calvos de tanto ouvir. Porém… quem não gostaria de ter seu próprio conto de fadas?

Se não é sobre acreditar na magia de construirmos nosso próprio destino e nas conquistas palpáveis, é sobre deixar-se ser acolhido por pequenos momentos que nos tiram de uma realidade, por vezes, amarga e sem expectativa. Precisamos cada vez mais das fantasias, tanto quanto elas precisam de nós para serem criadas. Talvez, não necessariamente como em “A Escola do Bem e do Mal“. Mas se divertir com as possibilidades e com a leveza de se imaginar herói ou vilão. Ou até mais do que isso.

Foto: Divulgação Netflix.

Até porque, não existem só dois lados; bem e mal, certo e errado. Quando se trata de viver; ou melhor: quando se trata de viver a nossa vida, podemos escolher o caminho que quisermos se, ao trilharmos, estivermos fazendo o que é bom para nós mesmos e para o outro. Os limites não precisam existir, mas o respeito sim. O respeito da escolha de cada um em escrever o próprio final feliz.


“A Escola do Bem e do Mal” já está disponível no catálogo da Netflix

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