Com o título original de Women Talking (“Mulheres Falando” em tradução livre), Entre Mulheres tenta ter voz, mas ninguém parece querer ouvir
A cultura do estupro é um termo que eu particularmente abominava. Isso porque achava impossível unir um assunto tão bom quanto a cultura com algo tão repugnante quanto o estupro. Com o tempo, essas duas palavras se manifestaram de forma diferente na minha mente.
A cultura do estupro está na forma que as mulheres são tratadas, em uma simples piada sem graça, ou na forma em que às vezes os homens a excluem de um determinado assunto, ou até mesmo em um comentário maldoso. Entre Mulheres aborda essas questões, mas de outras perspectivas, a das mulheres.
Mas, qual a trama de Entre Mulheres?
Baseado no livro homônimo de Miriam Toews e inspirado em eventos reais ocorridos na colônia de Manitoba, na Bolívia, o filme segue as mulheres de uma comunidade religiosa que lutam para conciliar sua fé com a realidade.
Em 2010, as mulheres da comunidade isolada seguem a religião da igreja Menonita, e acabam descobrindo um segredo chocante sobre os homens da comunidade que controlaram suas vidas e fé. É revelado que os homens usaram anestésicos para drogar e estuprar mulheres e meninas durante a noite por muitos anos, às vezes resultando em gravidez.
É tradição da comunidade quase menonita manter a mulher em um estado sem educação, sem escolaridade e analfabetismo, com o objetivo de ajudá-la a ser totalmente subserviente aos membros masculinos da comunidade e às suas necessidades.
O que achamos do filme?
Escrito e dirigido por Sarah Polley, Entre Mulheres já abre com casos de gaslighting sendo revelados, e uma violência que felizmente permanece oculta aos olhos do espectador, mas que nos faz acreditar em cada palavra dita.
As mulheres da comunidade estão discutindo a possibilidade de ficar e lutar ou partir, deixando suas histórias, traumas e principalmente homens para trás. A discussão dita o ritmo da produção, intercalada por pequenos flashes do passado.
As personagens são distintas no modo de falar e principalmente em suas opiniões. Existe aquela que quer vingança, enquanto outras pregam o perdão, aquela que coloca a culpa no sistema, e aquela que só quer recomeçar. Todos os pontos são esclarecidos, mesmo com o roteiro de Polley usando algumas analogias e metáforas.
Claro, o espectador pode tomar um lado, e acredito que será mais interessante se o fazê-lo, mas no caso de nós homens (eu e os que estão lendo esta crítica), só nos resta ouvir. O texto de Polley também é direto, usando palavras atuais e sem rodeios, às vezes caindo no expositivo.
Mesmo assim, a cineasta aborda discussões pertinentes sobre o silêncio com a mudança do corpo feminino, o papel do gênero na sociedade e porque não, a sexualidade e a transexualidade, tudo com extremo cuidado e sensibilidade.
Claire Foy ganha destaque por ser a mais questionadora daquele grupo, mas divide bem os lados e opiniões distintas com Rooney Mara e Jessie Buckley. Ben Wishaw é o “homem orelha”, e sua presença não incomoda, já que debate a importância da educação, e rende algumas cenas de riso involuntário, por mais que na maioria das vezes, o riso seja de nervoso.
Infelizmente enquanto as mulheres falavam, poucos as ouviram, inclusive a Academia, indicando o filme a apenas dois Oscars, e deixando um trabalho primoroso de direção e fotografia de lado.
Nota: 8