Por Trás dos Seus Olhos – Crítica | Quando o coração sente o que os olhos não podem ver

Por Trás dos Seus Olhos
Foto: Nick Wall / NETFLIX

Ninguém sabe o que está acontecendo em Por Trás dos Seus Olhos


Como diz o provérbio popular: “o que os olhos não veem, o coração não sente”. Porém, este não parece ser o caso de Por Trás dos Seus Olhos (2021), suspense psicológico da Netflix, que consegue acertar quando se fala em deixar o espectador mais perdido do que cego em tiroteio (me desculpem por essa frase), mas, ainda sim, perde uns pontos por sua repetição de narrativa.

A minissérie de seis episódios da plataforma vermelhinha, foi baseada no romance homônimo de Sarah Pinborough, e nos apresenta a simpática Louise (Simona Brown), uma mãe solteira que conhece David (Tom Bateman), um homem charmoso e, aparentemente, sozinho, num bar da cidade. Por uma grande coincidência, – ou não – eles acabam se encontrando no trabalho, uma vez que Louise será a secretária do recém-chegado psiquiatra que conheceu na noite passada.

Isso faz com que a ligação que acham ter, vá avançado para níveis mais íntimos, quando começam a desenvolver uma relação romântica. Tudo estaria bem, se David não fosse casado. Numa outra “coincidência”, a secretária conhece Adele (Eve Hewson), esposa do personagem de Bateman, com quem também parece criar certa empatia. Porém, quanto mais Louise se aproxima do casal, inúmeras dúvidas começam a atormentá-la, já que algo do presente não parece estar certo em decorrência de um passado perturbado.

Por Trás dos Seus Olhos
Foto: Nick Wall / NETFLIX

A história pode não parecer muito original, mas o diferencial se encontra em como a trama se desenvolve. Os primeiros episódios simplesmente jogam as informações, e o espectador vai traçando suas próprias linhas de raciocínio a partir do que lhe é apresentado. É interessante como o universo adaptado por Steve Lightfoot consegue, em algum nível, prever a explicação que estamos criando e, num certo ponto da trama, subvertê-la, deixando-nos com a sensação de que algo passou e não notamos.

É, inclusive, difícil de se definir um antagonista de Por Trás dos Seus Olhos, uma vez que essa subversão nos dá razões para culpar a todos que aparecem em tela. E a direção de Erick Richter Strand conduz a narrativa de uma forma um tanto quanto “confusa”, mas não no sentido ruim da palavra. A confusão, aqui, é necessária, pois ela é que vai alimentar nosso sentimento de surpresa com as reviravoltas da trama.

Isso acontece, até mesmo, quando tudo parece estar “avançando”, e as personagens estão chegando a alguma conclusão. No entanto, algo ainda incomoda; algo, na teoria do espectador, parece não se encaixar com o resto. E mesmo com uma narrativa mais repetitiva nos episódios intermediários, mas que, de certa forma, enriquece a construção das personagens, existe uma cautela ao plantar os detalhes, que são muito sutis e só se encaixarão posteriormente.

Por Trás dos Seus Olhos
Foto: Nick Wall / NETFLIX

Um exemplo disso é o episódio 4, intitulado “Rob”. A princípio, mais parece um pedaço do passado de Adele com o grande amigo que pouco importa para a trama, afinal, não foi deixado muito claro, ainda, a importância do personagem de Robert Aramayo ou no que mais ele poderia estar envolvido, além do evidente diário que lhe pertence e que possui grande matéria narrativa.

E é se aproveitando dessas faltas de sentido, e de uma história que se revela aos miúdos, que “Por Trás dos Seus Olhos” consegue ser uma ótima série para os amantes de suspense e os fãs do livro, que parecem orgulhar-se da adaptação. Mesmo com uma impressão de lentidão e de que “não está acontecendo nada de mais aqui”, a maior parte da produção ganha estrelas por:

  • sua incrível fotografia, capaz de deixar as sequências que remetem ao passado com tons saturados, em discordância com o presente, numa paleta mais cinza e opaca (as roupas de Adele são um diferencial: antes, com alguma cor ou estampa e, no presente, branca e quase sem nenhum detalhe);
  • pela criatividade da direção ao abordar o elemento sobrenatural que permeia a trama, algo que, pode parecer ter surgido sem mais nem menos na narrativa, mas que possui raízes antes exploradas, mesmo que de forma tímida;
  • e pelo elenco que, magistralmente, consegue ora se fazer de vilão, ora se fazer de mocinho, dando veracidade para seus sentimentos, principalmente o de que tem algo acontecendo, mas está além de qualquer compreensão racional.
Por Trás dos Seus Olhos
Foto: Nick Wall / NETFLIX

Por Trás dos Seus Olhos” é uma série fantástica que, à sua maneira, consegue abordar temas clássicos e genéricos de tramas sobre triângulos amorosos, como ciúmes, inveja e amor doentio, ao mesmo tempo que tempera com o suspense e o sobrenatural na mesma medida. Por sua narrativa lenta e movida a questionamentos, pode não ser algo atrativo para alguns espectadores que exigem explicações mais diretas, mas consegue usar seu elemento surpresa para fazer qualquer um arrancar os cabelos de indignação.

Ninguém parece saber de nada. E, na realidade, ninguém sabe. Porque, mesmo quando tudo já parece encaixado, nossas expectativas são subvertidas e mostram que, nem sempre, o que basta é o que está à nossa frente. Às vezes, os segredos de alguém, estão muito mais longe do que nossos olhos podem ver.


OBS: Esse texto foi escrito Ronald Aquino.


Por Trás dos Seus Olhos está disponível na Netflix


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2 comments
  1. Uma crítica bem construída e detalhada, sobre um trabalho o qual eu não vi!
    Não tenho conhecimento sobre, entretanto, após a leitura, vem a sensação de entendimento (sensação essa que por muitas vezes não conseguimos sentir nem mesmo ao final de toda a série).
    Parabéns a Ronald Aquino por sua dedicação e pelo belíssimo ofício.

    1. Agradeço pelo feedback!
      Tentamos ao máximo colocar dedicação em nosso trabalho, e sempre é bom ver que ele ainda é reconhecido e, o melhor, alcançou o objetivo que esperávamos!
      Valew! 🙂

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