Utopia

Utopia (1)Se vocês estão lendo esse texto é porque eu – por algum milagre – já consegui recuperar pelo menos 70% do meu cérebro depois de terminar Utopia. Uma série FODA (impossível classificá-la com outro adjetivo) que já entrou para a minha lista das melhores produções de todos os tempos.

A série, criada por Dennis Kelly, conta a história de cinco fãs de uma graphic novel chamada Utopia, que, mesmo sendo escrita por um louco, parece prever eventos catastróficos para a humanidade. Quando descobrem a existência de uma continuação não-publicada, eles começam a ser perseguidos por uma organização denominada The Network e são sugados para dentro de uma perigosa e mortal conspiração.

Talvez essa sinopse possa parecer um pouquinho simples ou muito normal, mas acredite quando digo que essas são as únicas coisas que Utopia não é. Ela também não é nem um pouco medrosa, lenta ou previsível. Ela é uma série que não tem medo de ser diferente e não pensa duas vezes na hora de tomar decisões ousadas. E isso não é restrito apenas às reviravoltas, já que a estética e a temática também fogem do comum.

Contando com o fato de só possuir 6 episódios por temporada, todo o desenvolvimento da série é feito sem nenhum rodeio e isso faz com que o espectador não consiga nem respirar. Quando você menos espera vem alguma informação que te faz pensar, uma morte inesperada ou uma reviravolta do caralho. Ou seja, é quase impossível não se prender ou se intrigar com o que você vai ver desde o primeiro episódio.

Utopia

É um desenvolvimento rápido que ainda abre espaço para decisões completamente fora do comum e o início da segunda temporada é o melhor exemplo disso. Depois de uma temporada inicial perfeita e um final explosivo, simplesmente a série volta com um episódio feito todo através de um flashback. Claro que isso se mostra muito importante para explicar fatos da primeira temporada e para desenvolver a segunda, entretanto isso deve ter sido frustante para o público que estava ansioso pelo retorno daqueles mesmo personagens. Eu, que assisti tudo em uma maratona, fiquei dividido entre a decepção e a admiração pela coragem do criador, então imagine o que sentiu o público que esperou quase um ano pelo retorno.

Como também disse, a série também tem uma temática extremamente corajosa, já que fala sobre algumas decisões que envolvem diretamente o futuro da humanidade. Fala sobre a maneira como os homens estão acabando com o planeta, mas fala disso através de muitas cenas de ação, suspense e decisões questionáveis. Não vou falar muito, porque é divertido assistir sem saber nada e descobrir tudo junto com os nossos “heróis”, mas a série fala sobre uma espécie de genocídio para manter o planeta vivo.

Nesse contexto também estão personagens brilhantemente escritos e construídos. Todos eles são extremamente carismáticos e tem suas próprias jornadas particulares, mas o mais interessante é que todos são humanos e por isso eu usei as aspas ao falar dos heróis. Eu achei muito interessante ver todos os personagens terem que tomar decisões difíceis e sofrer com as consequências, não importando se são heróis ou vilões. Todos tem motivações fortes e ações questionáveis em seus currículos e isso faz com que a missão de torcer por alguém seja extremamente difícil.

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E dentro disso ainda tem alguns personagens mais fortes, que tem jornadas realmente intensas. Principalmente Milner, Jessica Hyde (eu achava ela extremamente chata, mas o desenvolvimento do seu passado e seu emocional que vivem em uma montanha russa, me fizeram entender tudo e me apegar à ela) e Pietre (um psicopata em constrante transformação, que é melhor desenvolvido em 12 episódios do que Dexter foi em 8 temporadas), porque todos esses sempre estão no centro dos momentos mais surpreendentes e duvidosos.

Os atores também não deixam a desejar e constroem muito bem seus personagens. A maioria do elenco é desconhecida até para quem assiste séries britânicas com alguma frequência, mas a maioria esmagadora acerta em cheio nas suas interpretações. Algumas escorregadas aqui e ali, mas eu fiquei e procurei saber mais sobre muitos deles. Principalmente, Fiona O’Shaughnessy, Adeel Akhtar, Paul Higgins e Neil Maskell.

A parte estética da série também não fica para trás. A direção dos episódios é impecável, usando muitos planos-sequência, ângulos diferenciados e uma violência gráfica peculiar, que não poupa nem crianças. É um trabalho que me lembra muito Sherlock, Breaking Bad, Tarantino e David Fincher (de quem volto a falar depois).

 

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A fotografia e a trilha sonora também acompanham e marcam tudo isso de maneira exemplar. O primeiro aspecto ganha ainda mais importante pela maneira como trabalha com cores intensas e vivas em qualquer. Isso ajuda a ressaltar a violência, já que o sangue – e põe sangue nisso – parece ter cores mais vibrantes e marcantes que na vida real.

Como já citei Sherlock, devo dizer que tudo isso são características das séries britânicas, que são muito bem produzidas e menos conhecidas do que deveriam. Eu mesmo assisto menos do que gostaria, pois a acessibilidade à essas produções é mais complicada em relação a indústria americana. E de fato são mercados que atuam de maneira diferente, tanto que é fácil perceber que as produções da terra da rainha sempre tem menos episódios, mais tempo de produção (a própria Sherlock tem mais de dois anos de espaço entre suas temporadas) e menos erros.

E Utopia é um dos mais agradáveis acertos britânicos que já assisti, tendo duas temporadas curtas e irretocáveis. Ainda gosto mais do primeiro ano, porque o segundo deixa mais ganchos e coisas em aberto. A primeira temporada, mesmo tendo um final explosivo e uma reviravolta angustiante, poderia ter sido o fim da série, enquanto o segundo precisa de outro ano para ser efetivamente concluída. E o grande problema é que essa nova temporada não vai chegar, porque Utopia foi cancelada.

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Isso poderia ser um motivo para você não assistir o programa, mas não se deixe levar por essa impressão de que não vai ver uma história fechada. Isso não tem nada a ver, porque tudo funciona antes de se preocupar em deixar o “gostinho de quero mais”. Acredite que você não vai chegar nem perto de se decepcionar, mas se optar por não ver…

Se optar por não ver, ainda vai estar tudo bem, porque a série vai ganhar um remake americano. Após ver o que a Fox fez com Broadchurch, eu seria completamente contra isso, entretanto ela vai ser feita do jeito certo. A exibição fica por conta da HBO (canal fechado para não diminuir a cota de sangue), o roteiro será da ótima Gillian Flynn (Garota Exemplar) e a produção/direção de todos os 10 primeiros episódios estão na mão de David Fincher, um dos meus diretores favoritos. Não sei o quanto do original será usado, mas eu acabarei assistindo e espero que essa tenha vida mais longa do que seu antecessor.


OBS 1: A cena de tortura do primeiro episódio é uma das melhores (ou piores…) que eu já vi. Cena muito bem feita.

 

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