Ricos de Amor: Tomate, Romance e Netflix

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Sustentado por convenções padronizadas, Ricos de Amor planta clichês para colher uma comédia romântica minimamente funcional


Sei que já falei isso em diversos textos, mas preciso repetir os mesmos caminhos para começar essa análise: o cinema brasileiro se apoia principalmente em três pilares representados pelos dramas biográficos, pelos estudos sociais e pelas comédias. Dentro desse último gênero, os romances acabaram conquistando o coração (e o bolso) de espectadores, produtores e exibidores. Afinal de contas, estamos falando de obras que alcançam bilheterias consideráveis sem gastar muito com a produção.

No entanto, com o aumento do preço dos ingressos e a diminuição do público (algo que eu comentei nesse podcast), tais projetos começaram a perder espaço nas grandes salas. Por livre e espontânea pressão, os cinemas precisaram deixar de lado os “filmes médios” para apostar cada vez em blockbusters que arrastam multidões para fora de casa. Sucessos estrondosos cujo o resultado é garantido sem nenhuma objeção.

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Nesse cenário retroalimentado pelos próprios serviços de streaming, a Netflix olhou para esses gêneros “abandonados”, gostou da ideia (indiscutivelmente boa) de ter retornos consideráveis sem gastar muito e se tornou a nova casa das comédias românticas. Uma proposta que, na esperança de mexer com as mesmas multidões adolescentes alcançadas Noah Centineo e sua trupe, tirou do papel Ricos de Amor. Uma produção clichê e funcional que se encaixa com perfeição tanto no catálogo da Netflix, quanto nas raízes novelescas das comédias românticas brasileiras.


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A história acompanha Teto, um jovem rico que aproveita sua “solteirice” em festas cheias de garotas bonitas. No entanto, tudo começa a mudar quando o pai oferece um posto importante na empresa da família ao mesmo em que ele se apaixona por uma jovem médica que vive no Rio de Janeiro. Isso tira o “Príncipe do Tomate” da sua zona de conforto, obrigando-o a elaborar um plano – cheio de mentiras – para conquistar a confiança do pai e o coração de Paula.

Uma premissa bastante honesta que já deixa claro o que o público vai encontrar quando der o play. Não tem como alguém dar esse último passo sem saber que vai esbarrar numa lista de clichês que se repetem sempre que um personagem decide mentir para conquistar o grande amor de sua vida. Um repertório de chavões que vão desde a estrutura narrativa genérica (quem nunca viu um longa onde as mentiras vão crescendo sem controle até destruírem tudo, exigindo que um grande gesto romântico seja realizado nos últimos minutos?) até certas sacadas reprisadas. Nesse caso, temos mudanças de identidades, transformações em “pobre” e até trocas de roupa motivadas por dois eventos rolando ao mesmo tempo.

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Isso faz com que seja impossível ignorar o quanto Ricos de Amor é uma grande mistura de chavões repetidos e completamente previsíveis. Logo, não adianta ficar se apegando nesse detalhes para criticar o filme, porque acaba se tratando de um daqueles casos em que a produção escolhe um caminho e abraça seu estilo sem vergonha. Claro que a falta de originalidade ajuda na criação de uma experiência menos interessante, mas não é o que realmente faz o longa ser mediano. Esse trabalho fica a cargo de alguns diálogos vergonhosos, de um humor totalmente sem graça e de uma quebra temporal que não faz o menor sentido.

A questão é que, pra sorte do longa e até mesmo de quem está assistindo, Ricos de Amor também consegue acumular algumas coisas legais do outro lado de sua balança. Tem um elenco carismático liderado por Giovanna Lancellotti (Tudo por um Pop Star), Danilo Mesquita (Spectros) e Fernanda Paes Leme (Cinderela Pop), tem alguns planos que aproveitam muito bem as belezas da cidade, e acerta mão na evolução dos personagens durante a narrativa. Por mais que tudo aconteça de uma forma simplória e novelesca demais pro meu gosto, é necessário admitir que os protagonistas não terminam sua jornada do mesmo jeito que começaram.

São fatores que, mesmo presos em certas limitações, contribuem com o equilíbrio do longa. Não fazem Ricos de Amor se destacar de verdade no catálogo da Netflix, mas ajudam a cumprir seus objetivos perante uma parcela do público que consome tais produções com fidelidade. Em outras palavras, mais condizentes com o próprio filme: ele não é um Tomate Premium, mas pode funcionar como um aperitivo gostosinho numa tarde de quarentena.

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