O Agente Secreto é o novo filme de Kleber Mendonça Filho que estreou na competição do festival de Cannes, onde ganhou como melhor direção e melhor atuação masculina, além do prêmio FIPRESCI (associação de crítica internacional). O longa foi o escolhido para representar o Brasil no Oscar 2026.
A trama de O Agente Secreto
Em Recife de 1977, Armando, um pesquisador universitário, é vítima de uma conspiração do regime militar. Então, ele precisará se esconder para proteger sua identidade até conseguir fugir do país com seu filho, Fernando. Para isso, adota um novo nome e passa a morar em um prédio com outros refugiados.

O que achamos do filme
O Agente Secreto é, antes de mais nada, sobre a memória de um povo que, por vezes, tenta esconder/esquecer seu passado ou, simplesmente, não o conhece, seja por desinteresse, seja pelos esforços do sistema para mantê-lo escondido. Kleber reconstrói essa
memória utilizando o cinema de gênero – principalmente o thriller político – para contar uma história fictícia carregada de verdades.
Kleber ama e domina esse cinema, conhece seus clichês e nuances e sabe moldá-lo para encaixar suas convenções dentro de uma narrativa tão brasileira, tão pernambucana. Ainda que tenha, sim, momentos mais convencionalmente dramáticos – como os encontros entre pai e filho, ou a controversa cena final – a alma do projeto são esses elementos de gênero. É como um diretor recifense retrata a cultura de sua cidade – que é quase um personagem dentro da trama – a partir de uma mistura desses gêneros cinematográficos.
Tome como exemplo a cena da perna cabeluda – uma das melhores cenas do ano – em que Kleber dá vida a uma lenda de Recife, usando-se de elementos do terror/fantasia para criar uma passagem visualmente marcante e lúdica. O tipo de momento que um diretor com muito conhecimento técnico, mas sem bagagem cinematográfica, jamais conseguiria conceber.
Esse conhecimento do cinema, em especial de Hollywood dos anos 70s – época em que se passa o filme – é usado não só como piscadelas gratuitas para cinefilia, não é a referência pela referência. Tudo é aproveitado para, junto com o design de produção, evocar a reconstrução cultural da época e do local. O Tubarão de Spielberg lançado em 1975, que rima com as frequentes aparições de tubarões nas praias recifenses.

São essas referências de um entusiasta cinéfilo que dão o tom de O Agente Secreto e o separam de dramas mais tradicionais com temáticas semelhantes. A “questão relevante” está ali, porém o principal interesse é na construção do filme, como deve ser. Ainda que, em alguns momentos, o texto seja excessivamente didático, principalmente no final, durante a maior parte da obra, o que prevalece é um forte bom senso estético que combina imagens e música em passagens memoráveis.
O filme está longe de ser meu favorito do diretor, contudo a utilização das referências cinematográficas para construção da memória de um povo, rendem algumas das cenas que eu mais gosto em sua carreira. Não é somente sobre o Kleber fala, mas é como escolhe contar essa história. Talvez por isso o final – e todas as cenas no presente – me sejam tão frustrantes, quando o conteúdo parece falar mais alto do que a forma.
O Agente Secreto foi visto na 49ª Mostra de São Paulo, que ocorreu entre os dias 16 a 30 de outubro de 2025.

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