Mirrors no 3 – Crítica | O Hitchcock que habita em Christian Petzold

mirrors no 3
Foto: Divulgação

Há quem diga que todo grande diretor tem seu Vertigo – não me compete debater qual o grau de veracidade dessa afirmação – mas, caso isso seja verdade, é mais um testamento do quão gigante é Petzold, que já tinha um excelente Vertigo para chamar de seu – Phoenix – e agora tem Mirrors no 3.

A trama de Mirrors no 3

Após envolver-se em um acidente de carro e, milagrosamente, sobreviver, Laura é acolhida por uma mulher mais velha que se torna uma companheira e figura materna em sua vida.

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O que achamos do filme

O filme de Christian Petzold começa em um tom sombrio, premonitório: em uma estrada, os olhares de duas mulheres se cruzam momentaneamente, interligando-as a partir dali, só não se sabe como, ainda. Uma segue seu caminho, a outra fica parada, como se, inadvertidamente, esperasse pela volta da que se foi. A câmera de Petzold continua acompanhando a garota pela estrada, as vozes abafadas ao seu redor sugerem sua alienação ao seu entorno. Apesar de estar em um carro com mais três pessoas, sente-se tão só quanto a desconhecida que ficou para trás.

Assim que chega ao seu destino, surge um repentino desejo de voltar, como se algo a puxasse de volta – um magnetismo ou talvez o destino. Essa mesma força a leva até a porta da mulher, dona dos olhos que havia encontrado antes, que promete cuidar dela até que se recupere dos ferimentos causados pela colisão do carro. Estreita-se o laço que as ligava. Duas mulheres tão quebradas quanto a casa em que habitam. Uma cuidando da outra.

Petzold conta sua história com economia de palavras e sobrecarga de sentimentos, os frames e pedaços de conversas interrompidas nos contam tudo sem que muito precise ser dito. As expressões controladas, os gestos calmos e o ritmo contido puxam o espectador para mais perto de Mirrors no 3, quando conecta-o intimamente com suas personagens.

Moramos naquela casa, andamos de bicicleta com Paula Beer, plantamos flores e comemos bolo de ameixa. Ufanismos a parte, a câmera é um pincel na mão de Petzold que filme suas protagonistas por portas entreabertas e janelas. Imagem pensada, fotografia não apenas visualmente bonita, mas verdadeiramente impactante, usada de forma inteligente a favor da narrativa.

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A cena de jantar marca o início de cenas mais cômicas. O humor vem da situação desconfortável e da forma como cada personagem reage a ela. A comédia, que é uma característica tão incomum no cinema do diretor, acaba sendo muito bem-vinda aqui. Há várias formas de combinar gêneros diferentes e Christian Petzold o faz de uma maneira
bastante singular: o riso não quebra, nem reforça a tensão, ele vem como consequência dela. Claro que ele não é o primeiro, nem será o último a fazê-lo, mas é especial a maneira como faz.

Até mesmo quando aquilo que já sabíamos é finalmente verbalizado, as palavras são poucas e proferidas com uma violência que golpeia tão forte, sem soar expositivo ou verborrágico. O público já havia entendido, mas a personagem precisava ouvir. E Petzold conduz tão bem seu espetáculo que a verdade já conhecida ainda assim machuca o espectador, porque agora que foi dita em voz alta se torna indiscutivelmente conhecida por Laura, fazendo tudo cair por terra.

Mirrors no 3 foi visto na 49ª Mostra de São Paulo, que acontece dos dias 16 a 30 de outubro de 2025.

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