Pablo Larraín é famoso por suas “cinebiografias fabulescas” em que apresenta versões fantasiosas para contar a história – ou parte dela – de figuras importantes – Jackie, Spencer, El Conde (Pinochet) e agora MARIA (Callas). O filme estreou hoje, dia 29 de agosto, no festival internacional de cinema de Veneza.
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Qual a trama de MARIA?
Maria Callas, famosa por ter sido uma das maiores divas da Ópera, agora vive reclusa em sua mansão em Paris, cercando-se apenas de dois leais funcionários e dois cachorros. Apesar de sua saúde débole, Maria luta para reconquistar sua voz, na tentativa de reviver seus dias de glória.
O que achamos do filme?
MARIA é mais uma fábula de Pablo Larraín, que carrega fortemente os traços mais marcantes do diretor. Não é propriamente uma cinebiografia, assim como nos outros longas citados acima, o foco não é a precisão histórica com que narra a vida dessas personas, mas sim em capturar a essência de seus sentimentos, e isso Larraín faz muito bem ao adentrar nos pensamentos nem sempre coesos da protagonista.
Com o avanço da idade, a mente de Maria já não é mais a mesma, os remédios ingeridos em doses muito superior às recomendadas terminam de remover a fina cortina que separa sonho e fantasia da realidade, fazendo com ela viva em estado de puro delírio, ocasionalmente interrompido por breves momentos de lucidez.
À beira da insanidade, a protagonista nos conta a história de Maria, a mulher por trás da diva La Callas, enquanto luta para voltar a performar como antigamente e quem sabe conseguir o prestígio que possuía outrora, quando encantava a todos a sua volta. O filme pode ser resumido a essa busca pela voz, tanto metafórica, quanto literalmente, seja pelo desejo de ser a narradora de sua própria autobiografia, seja pela necessidade de conseguir cantar uma vez mais.
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Ela enxerga na música seu único valor e, por meio dela, busca o aplauso com a mesma ferocidade com que busca por seus comprimidos. Incapaz de conter o avanço do tempo, Maria sofre as limitações impostas ao seu corpo pela velhice, que hoje não tem mais o mesmo poder de sedução. Sua juventude foi tão passageira quanto seu talento e o ostracismo ao qual foi confinada lhe assusta mais do que a própria morte.
O diretor tem uma abordagem muito sensível para lidar com o envelhecimento, principalmente, ao mostrar tudo que ele representa para uma pessoa como Maria e como isso se reflete em sua (falta de) sanidade mental.
Criada em um ambiente opressor, foi através da voz que Maria conseguiu se libertar, por outro lado, chega a ser cruelmente irônico que essa mesma voz cheia de poder, capaz de hipnotizar multidões nos palcos, tenha sido tão silenciada fora deles. E agora é hora de Maria contar sua história, nos seus termos, ainda que seja para floreá-la quando bem entender, o importante é que seja contada na sua voz.