Trazendo questionamentos morais ao espectador, “Mãe de Aluguel” está disposto a fazer refletir e incomodar
Quando você está naquela aula de sociologia padrão, que explica a diferença entre ética e moral, na maioria das vezes nem liga muito. Agora, se você se deparar com os conflitos de “Mãe de Aluguel”, com certeza vai sentir falta de ter prestado mais atenção.
Jess Harris é uma web designer de 29 anos que trabalha em uma organização sem fins lucrativos no Brooklyn. Ela está em êxtase por ser a barriga de aluguel e doadora de óvulos de seu melhor amigo, Josh (Chris Perfetti), e o marido dele, Aaron (Sullivan Jones). Após 12 semanas de gravidez, um teste pré-natal retorna com resultados inesperados, o exame do feto para síndrome de Down dá positivo e Aaron e Josh já não têm mais certeza do que fazer.
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O início abrupto do filme de Jeremy Hersh nos coloca no meio da ação, fazendo uma bela relação com o dilema que os personagens irão enfrentar. A naturalidade da relação entre Jess e o casal de amigos, não levanta questionamentos, eles de fato se amam.
Mas o diretor não está disposto a apenas mostrar esse amor. Os longos planos são propositalmente usados para gerar desconforto. O uso excessivo da câmera na mão aproxima, mas também causa constrangimento. Um trabalho primoroso do estreante, assim como a protagonista, vivida por Jasmine Batchelor, que veio do teatro, e já foi indicada ao Gotham Awards pelo papel.
“Mãe de Aluguel” não romantiza a gravidez, mas também não a condena. Não vilaniza o casal, mas também não alivia para eles. O que se percebe é uma ignorância do tema, algo que Jess, a mãe, tenta mudar. Ao mesmo tempo, ela não quer fazer parte das estatísticas e estereótipos da mãe negra solteira, algo ressaltado por parte de sua família. Aliás, essa dualidade da personagem, onde não se sabe o que ela fará em seguida, é muito bem trabalhada em “Mãe de Aluguel”.
Os diálogos são crus, difíceis. Há pouco espaço para a emoção, já que o filme está disposto a ser objetivo, discutindo paternidade, filhos com necessidades especiais e até eugenia. A ausência de trilha sonora deixa tudo mais íntimo. Essas sutilezas estão em pequenas atitudes de outra família, onde a mãe Bridget (Brooke Bloom), possui um filho com a síndrome. É possível notar a dor e o amor na mesma medida.
Ao mesmo tempo, a relação de ambas denota certa materialização com a criança, a tornando um objeto de estudo, fazendo Jess recuar. Quando procura ajuda em outra mãe, digamos, mais otimista, sua decepção é ainda maior, desta vez não por culpa dela.
“Mães de Aluguel” é um drama ético sobre tomada de decisões. Quem um dia já pensou em se tornar pai ou mãe, já deve ter tido esse questionamento.