“Cigarra” usa de uma relação inter-racial para falar de diferenças sociais e traumas do passado
O início genérico de “Cigarra”, denota um problema em produções que tratam do mundo homossexual masculino: a artificialidade. Tudo e qualquer pessoa é descartável para os personagens, por isso, talvez o filme não atraia tanta atenção logo de cara. Mas vou usar a historinha do pote de ouro no final do arco-íris, para ilustrar esse pensamento.
Após uma série de encontros mal sucedidos e embaraçosos com mulheres, o jovem bissexual Ben, decide “voltar aos pintos”. Ele desenvolve uma intensa relação com Sam (Sheldon D. Brown, co-roteirista), um homem negro que também está lidando com suas próprias feridas. Enquanto o verão avança e a intimidade entre eles cresce, os passados de Ben e Sam, aparecem para a superfície.
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Cigarra / Foto: Divulgação
Aos poucos se aprofundando emocionalmente na vida de ambos, o filme de Matthew Fifer (que estrela, escreve, produz e edita o longa), em parceria com Kieran Mulcare, desconstrói os estereótipos iniciais de seu protagonista. Ben começa apático, entediado, dono de uma vida sexual ativamente fácil, mas aos poucos se revela um jovem cheio de traumas e fraquezas.
A combinação espontânea com Sam é imediata, e não carece de maiores explicações e conversas sobre gostos e afinidades. Os dois se gostam e pronto. Ao relembrarem o passado, momentos de abuso reacendem, cada um com seu recorte social/racial, experiência, auto-aceitação e impacto.


Cigarra / Foto: Divulgação
Quando sai dessa profundidade, tanto na relação, quanto na leitura das personalidades, “Cigarra” perde seu foco, tornando-se um filme com belas imagens, regadas a uma trilha pop e só.
A produção volta aos eixos quando se utiliza de um humor peculiar, principalmente vindo da figura da terapeuta Sophie, numa participação especial de Cobie Smulders. Essa forma de encarar as maiores dores, através de piadas, tornam Ben e e Sam mais ricos, individualmente e como um casal.
A partir daí, “Cigarra” começa um processo de cura nada fácil. Ben precisa reaver sua infância, e Sam sua relação com a masculinidade, principalmente em meio a homofobia que assola a comunidade negra americana. Há espaço para o romance? Claro. Mas não dizem que para ser feliz com outrem, você deve ser feliz sozinho?
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