Em Babilônia, Chazelle faz uma obra caótica mostrando os cantos mais sujos de uma indústria que cresce esmagando as pessoas que a formam
Texto escrito por Raissa Ferreira da Revista Singular
Se fosse necessário resumir Babilônia a uma palavra seria “caos”. O novo filme de Damien Chazelle trabalha uma atmosfera caótica desde os primeiros segundos, marcada ao longo do filme pela batida ritmada da trilha sonora, pela montagem acelerada, pelos acontecimentos absurdos e pelo tempo, sempre apontado pelo diretor, como quem além de contextualizar busca também criar uma sensação de que essa ação implacável das horas e dos anos está consumindo seus personagens aos poucos.
Qual a trama de Babilônia?
Babilônia começa pelos anos 20, se enfiando pelas festas regadas a drogas, sexo e estrelas de uma Hollywood clássica, do cinema mudo, e passeia pela evolução das técnicas da indústria cinematográfica, mostrando o lado de dentro das engrenagens que a fazem rodar. Mas não é o glamour que Chazelle quer mostrar, e sim a sujeira (literal e metafórica), os barulhos, as bagunças e tudo de pior que se esconde atrás da tela grande.
O que achamos do filme?
Não há uma grande preocupação aqui em se aprofundar em personagens, assim como todos os que vieram antes e depois deles, todos são apenas peças que fazem essa roda chamada cinema girar. Nos poucos momentos em que o filme se interessa mais por essas pessoas acaba por entediar, justamente por ir contra sua proposta.
De início, a jovem aspirante a atriz Nellie LaRoy (Margot Robbie) brilha por sua capacidade de atuar livremente nos sets extremamente caóticos e barulhentos dos filmes sem som e que pouco se importavam com o pudor. Da mesma forma, o já consagrado ator Jack Conrad (Brad Pitt) se destaca no meio da loucura como uma grande estrela em seus trabalhos.
Chazelle cria muito bem esse ambiente completamente maluco mas que também é um ambiente de trabalho, onde todos são peças funcionando para criar as obras, mas de forma totalmente caótica, na qual tudo parece que vai dar errado até que a câmera começa a filmar e a mágica acontece. Os barulhos se escondem no cinema mudo, o caos some nos bastidores e os atores maquiam seus estados de espírito e simplesmente brilham.
Tudo isso opera em contraste ao que se tornará o cinema no momento em que o som surge, fato já retratado em Cantando na Chuva (1952), e agora mostrado de forma mais agressiva em Babilônia, como uma revisita ao clássico por outros ângulos. O caos ainda rege os sets de filmagem mas agora tudo é controlado, silencioso e rígido.
Poderia ser apenas o saudosismo do diretor, mas também é um olhar honesto para o quanto o cinema sofreu para se adaptar às mudanças e evoluções técnicas, tudo em prol do lucro dos estúdios, correndo contra o tempo para criar filmes falados, preparados para isso ou não.
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Essa dura transição marca uma das sequência mais divertidas e engraçadas do longa e um fator decisivo para a decadência dos personagens. Enquanto Nellie sofre para se moldar a essa nova realidade, Manny (Diego Calva) cresce como trabalhador por trás das câmeras, ambos vivendo o sonho que Hollywood tanto vende. Porém tudo é mais pesadelo e inferno do que sonho, é uma jornada de deterioração, onde todos vão perdendo seu valor aos poucos.
Além das mudanças técnicas, Hollywood também se torna mais conservadora, caminhando na era do código hays. Já não havia mais espaço para os atores que não soubessem falar bem, performar no cinema falado ou se adequar às novas normas morais. O músico negro, o executivo latino, a mulher sexualizada e o ator que ficou velho, todos perdem seu lugar.
Assim, a indústria do cinema é retratada aqui como um ciclo que se renova esmagando todos que a formam, novos surgem e se vão, a evolução acontece e o cinema nunca para, nunca morre, apesar de matar alguns. Ainda que Chazelle passe quase todo o longa nos colocando nesse lado obscuro do cinema, o caminho de Manny nos devolve para onde sempre estivemos, no lugar mágico de espectador.
Tudo para lembrar que no fim os filmes são muito mais do que a sujeira de Hollywood, são arte, uma das partes mais bonitas e emocionantes do mundo, formados por grandes artistas que existem para sempre, imortalizados em suas obras.
Nota: 8
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